ENQUADRAMENTO
Bem vindes ao oitavo post!
A partir de hoje, nosso foco no projeto muda. Ao invés de trabalharmos sobre os elementos que estão em cena, exploraremos um pouco mais os elementos essencialmente videográficos, como planos, enquadramentos, movimentos de câmera, montagem sequencial, etc., em outras palavras: possibilidades de criação de sentido a partir da câmera.
É importante termos em vista que, diferentemente de uma apresentação ao vivo, o espectador não têm uma relação objetiva com o performer em cena, mas secundária — afinal, ele está em contato com uma tela, e não com um espetáculo. Sendo assim, é papel do vídeo trazer todas as sensações passadas pelo bailarino, bem como decodificar a linguagem da dança (corpo, espaço, movimento, emoção, som, poesia, etc.), “fazendo com que o espectador não somente vivencie a dança em questão, mas seja introduzido na sua linguagem” (CAPELATTO, MESQUITA, 2014, p. 38). Para isso, videomakers têm a sua disposição algumas ferramentas, as quais comentaremos nos próximos posts. Aqui, nos ateremos a dispositivos criativos no nível dos planos (o plano é a unidade fílmica entre dois pontos de corte).
Enquadramento
A começar pelo enquadramento, ou seja, o que está dentro do quadro (cena); para isso, é importante partir do princípio: o posicionamento da câmera. Capaz de mimetizar o olhar na forma de contar uma história, a posição da câmera representa o olhar pelo qual temos acesso à cena: trata-se de um ponto de vista.
Compreendendo que o olhar do espectador é direcionado pela posição da câmera, pode-se produzir efeitos de sentido, como objetividade, subjetividade, assumir o lugar de cúmplice, testemunha, etc. Uma câmera objetiva se coloca em terceira pessoa, observando os fatos de modo mais neutro. Entretanto, a câmera subjetiva insere o espectador na cena, podendo ver a cena pelos olhos de uma personagem. Para esse efeito, é comum a câmera estar posicionada sobre os ombros de quem está filmando, realmente registrando a sua linha de visão. Além disso, sua movimentação pode simular a de uma personagem*, se deslocando como se estivesse em cena — ou seja, qualquer tipo de aproximação/distanciamento da cena é feito andando, e não com o zoom da câmera. Normalmente, os planos feitos com a câmera subjetiva são mais longos (o que chamamos de plano sequência, no qual por um período de tempo relativamente grande não há cortes no vídeo). Em suma, no resultado é como se o espectador dançasse com os bailarinos, podendo vir a se portar como uma testemunha/cúmplice da ação.**
* Ver Roseland (videodança referenciado no primeiro post), onde o espectador adentra na cena, mas fica na surdina, se escondendo atrás da cerca enquanto observa os bailarinos — não há interação direta**.
** É interessante pensar na interação que os bailarinos terão com o espectador, se é que haverá interação. Esse espectador será percebido pelas personagens (normalmente, quando isso ocorre, elas encaram a câmera diretamente, com frontalidade)? Ele permanece escondido, despercebido? Afinal, são essas respostas que orientarão a direção quanto ao posicionamento objetivo ou subjetivo da câmera.
Ainda falando sobre possibilidades nessa relação entre o espectador e o enquadramento, é importante pensarmos não somente no que está em cena, mas também no que fica fora de cena. Mesmo que esses elementos não enquadrados não sejam vistos pelos espectadores, eles compõe o ambiente no qual a cena ocorre, onde as personagens estão imersas; sendo assim, há interação — direta ou indireta — com eles. Pensando nisso, pode-se instigar a imaginação do público gerando curiosidade sobre a ausência desses elementos: onde essa ação se passa? Para que olham as personagens? O que mais está acontecendo enquanto a cena se desenvolve? Essas questões podem servir como mote criativo na direção de um videodança.
Lateralidade
Tendo introduzido algumas relações consequentes do enquadramento, é hora de pensarmos em como fazer isso acontecer na prática. O primeiro ponto analisado será a composição cênica, ou seja, a disposição dos elementos.
Assim, um dos elementos a ser pensados é a lateralidade: disposição espacial dos elementos em cena. Pode-se trabalhar com a centralização das personagens no centro horizontal da imagem, podendo sugerir que são equilibrados, ou com a sua descentralização. Nesta, é comum a utilização do que, na pintura e fotografia, se conhece por regra dos três terços, pela qual a tela é dividida (horizontal e verticalmente) por linhas imaginárias em três porções idênticas. Em prol do equilíbrio harmônico, a personagem é posicionada sobre essas linhas, deixando o resto da composição livre para o cenário. Também é possível descentralizar o personagem seguindo o padrão de equilíbrio de massas, quando o espaço deixado pelo personagem descentralizado é ocupado por outros personagens ou elementos da cena. Utilizar a descentralização sem buscar o equilíbrio da composição pode sugerir certo desequilíbrio da personagem em questão.
[imagem acima - exemplo de regra dos três terços. fonte (e mais exemplos): https://designculture.com.br/a-regra-dos-tercos-no-cinema ]
Esses aspectos se aplicam a casos com um sujeito único sobre um cenário homogêneo. Quando há mais figuras em cena e elementos se deslocando, os resultados são diversos.
Ainda pensando em composição, é interessante pensar em paralelismos; isto é, criar relações, conversas, entre as linhas horizontais e verticais presentes na cena — podem ser personagens em pé/deitados, linhas de parede, a linha do horizonte, postes, … O efeito se dá quando há o nivelamento dessas linhas, ou seja, o enquadramento delas em paralelo com os limites do enquadramento da câmera.* Pensar em linhas, num geral, pode levar o filmmaker a obter resultados estéticos muito interessantes, além de criar significados como conforto/desconforto no espectador. É comum nos referirmos a um enquadramento “desalinhado” (desenquadramento) como ângulo holandês — normalmente usado para sugerir que algo errado está ocorrendo ou se anuncia, por ser característico na representação do desequilíbrio, desordem, caos.
*DICA: Para isso, é interessante utilizar um nivelador.
EXERCÍCIO
Proposta
O que propomos hoje é, de certa forma, a mais lúdica das propostas de pesquisa até agora. A ideia é utilizar as ferramentas apresentadas hoje (relacionadas ao enquadramento) para dar personalidade e individualidade, a personagens. Como explorar isso?
O primeiro passo é criar a personagem que terá suas personalidades exploradas. Para isso, pode-se usar ume bailarine, um pet, um objeto, a criatividade é o limite.
Decidido u protagoniste, deve-se escolher qual será a ação realizada por elu no vídeo. Pode ser uma coreografia, uma caminhada, um diálogo com a câmera, qualquer coisa.
A partir disso, existem algumas possibilidades:
filmar a personagem realizando a mesma ação com enquadramentos diferenciados, buscando trabalhar seu equilíbrio e desequilíbrio a partir da cena;
explorar possibilidades de personalidade a partir da câmera objetiva e subjetiva: filmando a personagem principal, pode-se assumir com a câmera uma segunda personagem e, então, explorar a relação entre elas (se dialogam diretamente, se a primeira têm ou não consciência da presença da segunda, etc).
Materiais necessários:
Câmera filmadora (pode ser a do celular).
Segue nosso vídeo
BIBLIOGRAFIA
Para esse post, foram consultadas as seguintes bibliografias:
A Arte do Cinema: uma introdução, de David BORDWELL e Kristin THOMPSON, 2014.
No Nível do Plano, resenha do blog Segundas Impressões, disponível em: https://assegundasimpressoes.wordpress.com/exemplo/cinema/no-nivel-do-plano/
Enquadramentos: planos e ângulos, postagem do blog Meu Primeiro Filme, disponível em: http://www.primeirofilme.com.br/site/o-livro/enquadramentos-planos-e-angulos/
Videodança, de Igor CAPELATTO, Kamila MESQUITA, 2014. disponível em: http://repositorio.unicentro.br:8080/jspui/bitstream/123456789/821/5/Videodança.pdf
Vale a pena ver também:
Então, pra quem gosta de cinema, vale conferir a completude da obra A arte do Cinema: uma introdução, de David BORDWELL e Kristin THOMPSON, 2014. Nessa onda, também é interessante o livro Sobre a História do Estilo Cinematográfico (2013), também do David BORDWELL.
Pra quem tem curiosidade, mas quer algo mais superficial, mais direto (porque os livros do Bordwell tem umas 700 páginas — são realmente obras bem completas), vale conferir os blogs citados anteriormente:
O Segundas Impressões, têm uma resenha sobre cinema bem completa, além de ter várias outras análises sobre o mundo do audiovisual. Disponível em: https://assegundasimpressoes.wordpress.com/exemplo/cinema/
Meu Primeiro Filme já é mais prático, e complementa bastante tudo o que foi dito aqui. Disponível em: http://www.primeirofilme.com.br/site/o-livro/introducao/