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TEMPO E ESPAÇO

Bem  vindes ao décimo segundo post!


Hoje o tema que abordaremos é curioso, pois apesar da sua manipulação ser a base na qual se estrutura a videodança, seus efeitos são completamente subjetivos, ou seja, variam conforme a percepção e as bagagens de cada um. Os tópicos do dia são o tempo e o espaço.


A citação de abertura de hoje é da artista visual e performer Amalia Ulman, cuja principal obra foi uma performance de três meses no seu instagram. Sua colocação, “quando as coisas se tornam imagem, elas se tornam ficção”, conversa muito com o que tenho estudado ultimamente: as características primárias das artes do tempo, mais especificamente a performance e a dança. A mais interessante dessas características não é o fato de elas apenas existirem em relação ao tempo (afinal, não são obras que transcendem o passar do tempo, como pinturas ou esculturas, por exemplo), mas o fato de que durante sua existência (só existem como tal no presente — afinal o registro não é a obra em si) são capazes de manipular a progressão do tempo, ou pelo menos a percepção que cada um tem do passar do tempo. O mesmo ocorre com as artes do espaço, que alteram de alguma maneira o modo com que percebemos o espaço que as rodeiam, bem como seu espaço interior — quem já passou pelo menos 10 minutos observando uma mesma obra num museu sabe como ela pode se transformar perante a nossa visão nesse curto espaço de tempo.


O que ocorre de interessante na videodança é que essas características fundamentais das artes do tempo e do espaço convergem, possibilitando ao artista criar um ambiente regido por regras espaço-temporais próprias, cuja natureza ontológica legitima sua própria autenticidade. Assim, responsável pela própria ficção, fica a cargo da direção determinar quais são essas leis ─ naturais e sociais. Estão à sua disposição diversas tecnologias, algumas delas já apresentadas aqui neste blog, as quais devem ser conhecidas e exploradas com a finalidade de melhor servirem como ferramentas para expressão dessa atmosfera.


Em suma, para criar uma boa ficção, coerente/verossímil dentro da sua própria proposta, é necessário pensar qual proposta é essa dentro da narrativa criada: o ambiente simula a realidade? Ou é o delírio de uma personagem? O tempo passa da mesma forma em todas as cenas? Ou elas representam interpretações diferentes da realidade? Que realidade é essa, afinal? Essas, e outras perguntas, não precisam necessariamente ser respondidas no vídeo, cuja proposta pode ser justamente questionar o espectador, entretanto elas não podem passar despercebidas pela direção. 


Assim, ao criar uma videodança, é importante questionar essas coisas: como posso explicitar a diferença na progressão do tempo em cenas diferentes? Isso gera tensão ou relaxamento em quem assiste a cena? A narrativa se passa no mesmo momento espaço-temporal? Ou é um flashback da personagem? Ou, de repente, até uma projeção futura? Pensar essas questões amplia as opções de universos criativos da direção. 



O cinema, desde sua criação, vêm se aperfeiçoando em técnicas filmográficas para aprimorar a ilusão criada na tela. Muitos recursos são tratados na fase da edição de vídeo, como a alteração na velocidade das cenas, alternância na ordem dos planos e a aplicação de filtros na iluminação, por exemplo. Entretanto, várias outras são trabalhadas durante as filmagens, como a marcação de características nas personagens em diferentes períodos da história (por exemplo, podendo ficar mais ranzinzas com o passar dos anos); a utilização de cores e objetos para explicitar diferenças no cenário e de tempo; mudanças na iluminação, bem como jogos de luz (por exemplo: é muito comum a simulação da luz do sol descendo na janela como indicação do passar das horas, mesmo que a cena tenha durado apenas alguns segundos); a duração dos planos fotográficos, deixando-os mais curtos para indicar a simultaneidade de fatos ou causar um sentimento de excitação, bem como a utilização de planos longos pode tensionar o espectador. Igor Capelatto e Kamila Mesquita enfatizam, ainda, a importância do som nesse processo, afirmando que:


“Paisagens sonoras podem dialogar com a percepção do vídeo não somente no plano simbólico de cada cena, da narrativa visual, mas com o ritmo do vídeo, criando sensações de tempo, espaço e emoção. [...] É o usufruir do ritmo, da duração de um elemento sonoro, do tempo e do contratempo, dos impulsos e repousos e das pausas como sinal de corte de uma cena. Quando a imagem segue o ritmo da paisagem sonora ocorre um fenômeno que associa a imagem diretamente ao tempo do som. Toda e qualquer mudança sonora é diretamente espelhada na imagem, na sua compreensão — permitindo, assim, que qualquer imagem siga o percurso da paisagem sonora em questão.” (CAPELATTO, MESQUITA, 2014, p. 89)

As artimanhas são infinitas.

Dia 12: Texto

EXERCÍCIO

Proposta

Para explorar questões espaço-temporais, não há leis estabelecidas. Porém, a busca por essas artimanhas pode ser feita de algumas maneiras, as principais são: realizando uma pesquisa visual por vídeos (não necessariamente de videodança, afinal o cinema passou os últimos anos desenvolvendo suas ferramentas ilusórias), assistindo-os com um olhar crítico e analítico, buscando identificar os dispositivos utilizados e os efeitos conseguidos; ou pode-se partir para a prática, num laboratório de criação e experimentação.

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Dia 12: Vídeo

BIBLIOGRAFIA

Sobre esse assunto, é interessante conferir:

  • Devido ao caráter subjetivo desse tópico, não há estruturas concretas para alcançar resultados objetivos. Entretanto, algumas reflexões sobre poéticas e possibilidades podem ser aprofundadas.

  • De seres humanos reais e performers verdadeiros, de Annemarie M. MATZKE (tradução de Stephan Baumgärtel). Texto publicado na revista Urdimento, nº 18, 2012, apresenta considerações a respeito da autenticidade que podem ser levadas para o meio virtual.

  • Luz, tempo, espaço : a percepção e a manifestação do fenômeno poético visual na imanência do objeto, tese de doutorado de Denise de BARROS, 2015. Disponível em: http://bdtd.ibict.br/vufind/Record/CAMP_215d7a72c9b5cfb6a56a03d3b65f00d1 

  • Metamorfose híbrida, percepção do tempo-espaço: uma tentativa de compreender a essência da arte, o ato humano de ressignificar compulsivamente diante da arte, artigo de Igor A. CAPELLATO, Fernanda C. BORGES e Ernesto G. BOCCARA, 2015.
    Disponível em: https://www.revistas.ufg.br/VISUAL/article/view/39168 ► Eis aqui um dos artigos que marcaram a minha vida enquanto artista e consumidora de arte. Recomendo fortemente a leitura! 

  • Percepção do lugar: o modo relacional entre arte, artistas, público e espaço urbano, artigo de Camila G. X. R. dos SANTOS, 2015. 

  • Tempo subjetivo e percepção de movimento em obras de arte, artigo de Francisco Carlos NATHER e José Lino Oliveira BUENO, 2006, disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-294X2006000300003&script=sci_arttext

  • Videodança, de Igor CAPELATTO, Kamila MESQUITA, 2014. disponível em: http://repositorio.unicentro.br:8080/jspui/bitstream/123456789/821/5/Videodança.pdf 

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